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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Biografias em risco

No último dia 31, mais um round na luta pela preservação da memória e na propagação da história do país, foi perdido. O projeto de lei que atinge em cheio o mercado de biografias no país, do então deputado federal Antonio Palocci, foi arquivado na Câmara dos Deputados. Basicamente uma emenda ao artigo 20 do Código Civil, permitindo “a divulgação da imagem e de informações biográficas sobre pessoas de notoriedade pública, personalidades da política e da cultura”, o projeto é fundamental para o futuro do gênero no país. Que, apesar de consolidado em nosso mercado editorial, com leitores fiéis, bons autores e vendas significativas, tem sofrido pressões e derrotas nos últimos anos que aos poucos o vão inviabilizando.

Biografias em risco II
No último sábado, o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que como congressista apoiava o projeto de Palocci, se comprometeu a conversar com o atual Ministro da Casa Civil no sentido de encontrar algum deputado sensível à causa, que possa reapresentar o projeto na nova legislatura recém-empossada. É um alento que, se confirmar, volta a colocar em evidência o tema, que tem como antagonistas a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e deputados como Paulo Maluf.

Biografias em risco III
Só para refrescar a memória do leitor da coluna. A lista de exemplos de biografias que sofreram algum tipo de retaliação judicial nos últimos anos é grande. Da indenização, no mínimo inusitada, a um “personagem” de “Meu nome não é Johnny”, do jornalista Guilherme Fiúza, que mesmo com a utilização de nomes fictícios na obra, se viu obrigado a ressarcir, assim como sua editora, o cidadão que teria servido de inspiração para a composição de um personagem secundário da obra. Mais cruel foi a retirada de circulação da biografia do cantor Roberto Carlos, de Paulo César Araújo. Algo já ocorrido nos anos 1990 com Ruy Castro e as herdeiras de Mané Garrincha. Além de situações no mínimo esdrúxulas, como as ameaças por escrito da quarta esposa de Raul Seixas, Kika Seixas, endereçadas a diversas editoras que eventualmente venham a publicar alguma biografia não-autorizada do falecido roqueiro.

Biografias em risco IV
A censura às biografias não pode ser dissociada da não abertura de arquivos e a restrição ao acesso a documentos importantes da nossa história. É difícil imaginar uma democracia que não ofereça a seus cidadãos a oportunidade de conhecer os processos que formataram a nação em que vivem, ao longo de décadas, séculos. Ao mesmo tempo, soa mais coerente a regimes não democráticos a escolha do que se deve ou não ser exposto à sociedade. Afinal, a quem é transferido o direito da população escolher as partes de sua história que pretende conhecer? O “Notícia em foco”, da CBN, do último dia 24, tratou do tema com os escritores Guilherme Fiúza e Fernando Morais. Para ouvi-lo clique no link abaixo. 
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O centenário de Bishop
Os cadernos culturais do último final de semana trouxeram praticamente sem exceção matérias sobre o centenário da poeta Elizabeth Bishop. A americana, que viveu no país por mais de uma década, é um grandes do gênero no pós-guerra. Que a efeméride desperte no leitor brasileiro um renovado interesse na autora que João Cabral de Melo Neto definiu em poema como dotada da rara capacidade de filtrar “o essencial/que todos vemos mas não vemos”.

José Godoy
José Godoy é escritor e editor. Mestre em teoria literária pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP), colabora com diversos veículos, como a revista "Legado", da qual é colunista, e os jornais "Valor Econômico" e "O Globo". Desde 2006, apresenta o programa "Fim de Expediente", junto com Dan Stulbach e Luiz Gustavo Medina. O blog do programa está no portal G1.
Entre em contato pelo e-mail zegodoy@hotmail.com